Sobre
A comunidade escolar está hoje desafiada a responder a uma maior diversidade de perfis de aprendizagem e de funcionamento, impondo-se o desenvolvimento de contextos também eles mais diversos e flexíveis na conceção de oportunidades de participação e aprendizagem para todos. Esta missiva tem colocado a inclusão no centro de uma transformação da cultura e filosofia das escolas e das suas práticas pedagógicas. O espectro cultural e pedagógico desta mudança, remete para um entendimento do conceito de inclusão que abarca, para além, da promoção de um ensino para todos – “reaching all learners” através da diversificação e diferenciação de estratégias – o compromisso de incluir os próprios alunos como agentes interventivos na construção e transformação da escola – “reaching all as learners and also as partners” (e.g., Esteban, 2022).
É sobre este ethos da inclusão, que encaramos a gamificação como um fenómeno que cumpre com o desígnio da diversificação das estratégias pedagógicas e que, simultaneamente, constitui um instrumento instigador da co-construção de recursos e atividades da sala para e com os alunos. De acordo com Werbach e Hunter (2012), a gamificação é a aplicação de elementos típicos de jogos (como pontos, competição e recompensas virtuais) a atividades que não são jogos. A ideia é a de envolver os sujeitos, inspirar ações, promover a aprendizagem e resolver problemas, através do uso de jogos e técnicas de design de jogos (Deterding, Dixon, Khaled & Nacke, 2011). No quadro de uma educação inclusiva, torna-se importante equacionar o uso destes recursos de gamificação, por um lado, como apoios universais para a aprendizagem - estendendo-o a todos os alunos independentemente das suas particularidades no funcionamento – e, por outro lado, como um meio/ferramenta de participação e agência dos alunos na construção dos seus contextos de aprendizagem. Foi assente nestes pilares que em 2020, foi desenhado o projeto +Power. Esse projeto resultou de um trabalho colaborativo entre o projeto salaS!Mbiose e o Estabelecimento Prisional de Castelo Branco, encabeçado pelos Professores Luís Baião e Paulo Serra, respetivamente.
O +Power surgiu de duas ações convergentes: - No projeto salaS!Mbiose os alunos com medidas de apoio adicionais (alvo de Programas Educativos Individuais- PEI), em parceria com os seus professores, criavam quizzes em Powerpoint para serem apresentados dos seus colegas, nas suas turmas. - No Estabelecimento Prisional de Castelo Branco os jovens reclusos criaram, através de materiais reciclados, uma Consola Inclusiva, com uma configuração capaz de promover maior acessibilidade física e intelectual (https://youtu.be/8c1j_PHiVc4). O +Power incorpora, assim, um caracter inovativo no seu produto e processo, designadamente: - a utilização de uma Consola Inclusiva – que materializa o objetivo de estender os recursos pedagógicos de gamificação a todos, promovendo a acessibilidade física e intelectual para a participação em quizzes; - e uma abordagem de co-construção de quizzes através de mecanismos mais intuitivos (como é o PowerPoint) permitindo que todos os alunos, incluindo aqueles com dificuldades intelectuais, participem no processo de desenvolvimento dos recursos pedagógicos com os seus professores.
O +Power tem sido apoiado financeiramente por diferentes entidades. Em 2021, foi financiado pelas Câmaras Municipais de Gaia e Castelo Branco com o objetivo de produzir 20 consolas. Mais recentemente, em 2023, a Fundação Rosenblatt financiou a construção de 200 consolas com o objetivo de replicar o projeto noutras escolas. A replicação do projeto encontra-se balizado por um modelo de implementação tri-etápico que inclui: 1- uma ação de formação inicial dirigida aos professores que visa a apresentação da consola e da abordagem de co-construção dos quizzes, numa relação colaborativa entre os professores e os alunos com necessidades adicionais de suporte. Esta formação é concebida e ministrada pelos próprios jovens do projeto salaS!Mbiose. 2- Em cada escola, será constituída uma equipa local + Power composta por 1-2 professores e 2-3 alunos com medidas adicionais de suporte, que trabalharão colaborativamente para a co-construção de quizzes;
3- Em cada escola, os quizzes desenvolvidos colaborativamente pela equipa local +Power serão usados em sala de aula com toda a turma, com recurso à Consola Inclusiva. O presente projeto de investigação pretende documentar implementação do + Power nas escolas e avaliar o seu impacte quer na promoção do envolvimento de todos em atividades de gaming na sala de aula, quer na dinamização de processos de co-construção de recursos pedagógicos entre os alunos e os professores. Não atribuindo apenas ao contexto escolar o imperativo da inclusão, também esta investigação consubstancia um processo de co-construção inclusiva de conhecimento. Em conjunto com 2 jovens do projeto salaS!Mbiose, com os 2 professores fundadores do projeto e com os 3 investigadores do inED, este projeto pretende responder a três questões:
(i) Qual a aderência, satisfação e utilidade atribuída pelos professores à implementação do +Power nas suas escolas?
(ii) Em que medida os processos de co-construção de quizzes produzem experiências que promovem o empoderamento e sentido de agência dos alunos com necessidades de apoio adicionais?
(iii) Em que medida o uso da Consola promove uma implementação inclusiva de quizzes, catalizando o envolvimento de todos os alunos, incluindo aqueles com limitações motoras e/ou intelectuais? Este projeto, com duração de um ano, apoiar-se-á num desenho de investigação misto que pretende documentar qualitativa e quantitativamente as experiências decorridas da implementação do +Power, avaliando o seu potencial de transferibilidade para outros contextos educativos.
Refª inED/2024/1